Calor entre os dedos
Batidas sucederam na minha porta enquanto me arrumava para o almoço na casa de Tadeu. Abri, e me deparei com Cristiano. Seu olhar desconfiado e furtivo se esgueirava, mas desde o ocorrido, ele ainda não tinha falado comigo.
— Eu queria te fazer uma pergunta... – dizia ele timidamente – Somos amigos, certo?
—Por que não seríamos?
Ele bateu os pés descalços no chão, as mãos enfi*das no bolso, o olhar direto para o movimento que fazia, e se virou pra mim.
— Eu não vou no almoço, mas espero que se divirta.
— Por que não?
— Não estou muito bem para interagir, e sei o quão isso é importante para ti, e eu... – ele engoliu em seco – Você entende, né?
— Eu gostaria que você fosse – o encarava de relance – mas, se não se sente à vontade, eu vou respeitar isso.
Cristiano, sem dizer mais nada, deu as costas e foi embora para seu quarto. Terminei de me arrumar e encontrei com o restante da família próximo ao carro que nos levaria.
O único problema era que a caminhonete só tinha vaga na frente, e por conta disso, foram os quatro espremidos. Catarina ia ao lado da porta enquanto eu ia ao seu lado. Ela lia um livro compenet*ada.
— Tadeu deve estar muito animado com a sua ida até lá, Téo – Cíntia dizia animada.
— Só minha mãe que não está muito feliz com isso...
— Jura? – ela perguntava curiosa – mas por quê?
Recordei-me de sua ligação, a qual passara mais de meia hora discutindo comigo, e falando como Tadeu era um idiota e que ela o odiava com todas as forças, e que torcia que algum animal da fazenda que ele dizia ter o comesse ou o arrastasse pra dentro do açude que ele também dizia ter pelas pernas. Todos riram, mas ela realmente tinha dito aquilo.
Chegamos no local, e ao descer, vi que Tadeu passava de um lado para o outro, apontando para as coisas. Usava um traje menos formal do que anteriormente. Com uma camisa entreaberta, bermuda e chinelos, o cabelo para trás, ajudava a organizar a mesa ao qual seria servido o almoço. Era tudo arrumado demais, lembrando o almoço de domingo na casa da minha avó fazia quando minha tia chegava de viagem.
Alfredo logo foi até ele, e ele cumprimentou a todos com um abraço, com exceção a mim, que foi um aperto de mão.
— Querem tomar alguma coisa? – ele apontava para trás – Cíntia, um vinho? Coloquei pra gelar um do Porto, seco.
— Seria ótimo – ela sorria enquanto segurava seu braço.
— Teodora, você aceita uma taça?
— Não, obrigada – neguei com a cabeça.
— Não bebe?
— Ainda está cedo...
— Essa aqui eu sei que vai querer – ele apontava para Catarina – fiquem à vontade, por favor, já volto. Tem certeza que não quer nada, Teodora?
Concordei com a cabeça, realmente não queria nada. Não demorou para que ele viesse com o vinho em um balde com gelo, colocado na mesa feita especialmente para isso, e as taças. Para Alfredo, ele tinha levado uma cerveja, serviu a todas e brindaram.
— O almoço ainda vai demorar um pouco, questão de meia hora – ele se movimentava de um lugar para outro – o que querem ouvir? Teodora, o que gosta de ouvir?
— Nada em especial – batia minhas mãos uma na outra – o que rolar, pra mim está ótimo.
Catarina ria consigo mesmo enquanto bebia. Estava ao meu lado, enquanto seus pais conversavam algo entre si.
Analisava Tadeu olhando para uma caixa de som, mexendo no controle e logo no telefone, selecionando algumas músicas.
— Não é engraçado quando um homem tenta te impressionar? – dizia Catarina entre os dentes e dei um riso contido. Não por vê-lo tenso, mas pelo jeito que ela tinha dito isso.
— Não tive muitas demonstrações disso na minha vida... – dei com os ombros, e ela arqueou as sobrancelhas levemente.
— Imagino que não – ela respondia com certa ironia, e me olhou de relance.
— Meninas, trouxeram roupa de banho? – ele disse ao se sentar ao lado de Alfredo e Cíntia, bem à nossa frente – Pra tomar banho na piscina.
— Eu não tenho... – cerrei os olhos. Quando arrumei minha mala, a última coisa que pensei era em uma roupa apropriada para isso.
— Bem – ele balançava a taça nas mãos – se você trouxe uma muda de roupa, pode...
— Mas, eu trouxe – ela virou o resto do vinho que tinha em sua taça de uma vez – não ia perder essa oportunidade.
— É claro – ele gesticulava para ela, que se levantou - fique à vontade. Teodora irá acompanhar?
— Ela vai – disse por fim, gesticulando para que a seguisse, e assim o fiz, agradecendo por dentro de não ficar ali.
Estava no meio do dia, e o calor era escaldante. Tinha vontade de tirar a roupa que usava, e compreendia a vontade imediata de Catarina em se jogar na água e viver nela. O clima ali era imbatível entre o mormaço do dia e a chuva que caía no meio da tarde quase que diariamente.
A piscina era imensa, provavelmente a maior que já tinha visto em uma casa. A água era límpida, e parecia estar ótima, indo contra o calor que fazia. Sentei-me debaixo de um guarda-sol, e levantei as mangas de minha camiseta.
— Está com receio do seu pai? – ela dizia colocando os óculos de sol – ele está se esforçando para causar uma boa impressão.
— É que não sei bem o que dizer... – Dei um breve suspiro – E sou meio ruim de puxar assunto, ainda mais com ele.
Catarina virou em minha direção, e tirou de sua bolsa o protetor solar, colocando-o em minhas mãos.
— Passa um pouco no seu rosto, vai precisar.
Pressionei o protetor em minhas mãos e passei aquele conteúdo viscoso que detestava em minhas mãos. O cheiro me remetia diretamente a quando minha tia me levava para a praia e passava isso por todo o meu corpo, pedindo para que eu esperasse o tempo de fazer ação. Fazia anos que não ia à uma.
— Além de que... – suspirava baixo – Tudo parece uma história mal contada.
— Seu pai mentiu querendo outra vida – Catarina arrumava as coisas em sua bolsa – e sua mãe deixou isso pra lá por algum motivo que não quer compartilhar contigo. É só questão de tempo até tu tirar suas próprias conclusões.
— E o que seria isso que ela não quer falar?
— Além de sua mãe, ela é uma pessoa – ela esfregou os dedos no meu rosto, provavelmente em uma parte do protetor malpassado – tem coisas que não compartilhamos com ninguém.
Ela estranhamente tinha razão. Dei de ombros, concordando.
Catarina levantou a camiseta na minha frente como tinha feito quando me levou para tomar banho no começo da manhã, mas, dessa vez, não tive tempo de desviar o olhar e a vi, levantando cada parte do que a cobria, colocando de lado enquanto balançava o cabelo bagunçado e abaixava o short que usava, ficando de costas para mim.
Jogou o cabelo de lado, e pegou o protetor, passando o produto em seus ombros, olhando-o de lado, arrastando a ponta dos dedos em cada uma daquelas inúmeras sardas que tinham em seu corpo.
Desviei o olhar, passava a mão pelo meu pescoço, sentindo meu ar fugir pelo calor que fazia ali, mas meu olhar continuava atraído em ver o que Catarina fazia com suas mãos. Seu corpo curvilíneo em frente a mim, que descia as mãos por suas pernas enquanto passava o protetor em si, eu fiquei olhando a tudo aquilo em silêncio, até que virou e olhou diretamente para mim. Senti seus olhos penet*arem os meus.
— Teodora?
Ouvi Catarina me chamar mais uma vez, me tirando dos meus pensamentos.
— Desculpe, estava pensando alto.
— Pode passar protetor nas minhas costas?
Pressionei os olhos, concordando. Ela afastou o cabelo de sua costa, deixando-o à mostra e se sentou de costas para mim. Devagar, comecei a passar protetor nela. Analisava cada mancha que ali tinha, sua sinuosa nuca, o lóbulo de sua orelha com minúsculas cicatrizes de buracos que outrora tinham brincos agora fechados. Meus dedos tocavam sua pele, desciam por sua costa e voltava e ela, ali, imóvel.
— Terminei – devolvi o protetor em suas mãos.
— Acho que faltou aqui – ela apontou para seu pescoço, e eu, seguindo suas instruções, passei meus dedos devagar, espalhando o protetor na parte que faltava.
Limpei minhas mãos e a vi prendendo o cabelo novamente.
— Eu...vou lá pra cima, se não se importar. Está... – disse ao me levantar – Muito quente, né?
— Está mesmo – ela foi até a piscina – não quer mesmo tomar banho?
— Não, obrigada – neguei com a cabeça, e fui seguindo a direção da casa.
Ela, dando de ombros, pulou na piscina e após um longo mergulho, começou a nadar de costas. Passei a mão em meu rosto, molhado de suor. Ainda assim, senti que podia respirar novamente.
Fim do capítulo
O que será que rolou aí?
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shoegazer Em: 03/03/2024 Autora da história
como lidar com essa mulher?