Capítulo 65 - A médium poderosa
A ILHA DO FALCÃO -- CAPÍTULO 65
A médium poderosa
Natasha acordou com um sobressalto ao ouvir a porta do quarto sendo aberta e fechada devagar. Por alguns segundos, foi tomada por uma sensação estranha de irrealidade. Olhou para o lado e viu Talita olhando distraidamente pela janela.
-- Que horas são? -- perguntou, de repente.
-- Oh, Natasha! Você me assustou! -- exclamou a médica, com um sorriso fraco -- O que está fazendo acordada a essa hora?
-- Para ficar mais tempo à toa -- ela disse, esfregando os olhos.
-- Só se for para isso, mesmo -- afirmou Talita, com um ar de indignação.
-- Preciso conversar com a Elisa e a Pedrita. Você poderia chamá-las para mim? -- pediu Natasha, ajeitando a cabeça no travesseiro.
-- Claro. Vou pedir para o comandante buscá-las na ilha.
-- Muito obrigada, doutora -- Natasha sorriu, agradecida.
Talita pegou o celular do bolso, e caminhou para a saída.
-- Mais uma coisa, doutora.
Talita se virou e retornou para perto da cama.
-- Sim?
-- Você já teve a sensação de que o que você está vivendo não é real, uma sensação estranha, como se seus olhos enxergassem um mundo que parece real, que você está vivendo dentro de um sonho ou filme.
-- Verossimilhança?
-- Exatamente -- Natasha concordou, olhando com curiosidade para a médica.
-- Eu sei aonde você quer chegar -- Talita se sentou na cadeira ao lado da cama.
-- Sabe? -- Natasha levantou uma sobrancelha -- Então, me diga.
-- Você teve um sonho, tão real como eu estar aqui, agora, à sua frente.
-- É, porém, algumas lembranças são fragmentadas.
-- Como médica, posso dizer que existe uma doença que aflige inúmeras pessoas e elas nem sabem disso. Sentir que está vivendo dentro de um sonho ou filme, o indivíduo tem uma sensação de ser um observador externo dos próprios processos mentais e do próprio corpo. Há também o sentimento de anestesia sensorial e alteração na percepção, as pessoas parecem "estranhas" ou "mecânicas". O indivíduo se sente separado do próprio corpo. Esses são os principais sintomas da desrealização ou despersonalização. Em outras ocasiões o paciente sente que o próprio corpo aumenta e/ou diminui de tamanho, isso é conhecido como síndrome de Alice no País das Maravilhas (o nome é referente à história de Alice, que muda de tamanho durante todo o conto. Às vezes ela cresce e fica enorme, às vezes diminui a ponto de parecer uma miniatura, tudo depende do cogumelo que ingere). O que não é o seu caso.
-- Que coisa louca! -- Natasha sorriu -- Não, com certeza não é o meu caso.
-- Você sonhou com a Andreia?
-- Se foi sonho ou realidade eu não sei, a única coisa que sei é que, foi um presente que nunca imaginei receber -- lágrimas queimaram em seus olhos quando olhou para Talita -- Deus, como sinto saudade dela.
Talita foi até a geladeira e voltou com uma garrafa de água fria. Abriu-a e entregou para ela.
-- Beba. Você vai se sentir melhor.
Natasha bebeu o líquido refrescante e respirou fundo. Os lábios se moveram, mas não articularam som nenhum. Talita tocou no ombro dela para reconfortá-la.
-- Estou confusa, não sei mais no que acreditar. Queria tanto ter fé, eu juro. Mas não é tão fácil assim, peço tanto pra ele me ajudar nas dificuldades que estou enfrentando, as vezes chego a pensar que Deus não existe. Falar é tão fácil, mas, na prática, mesmo, é muito difícil acreditar em algo imaginário! Muitas pessoas dizem que ele fala com elas. Mas comigo nunca falou. Queria tanto que ele falasse comigo pra eu poder crer de verdade. O que eu faço?
Talita fez um trejeito com a boca.
-- Talvez eu não seja a pessoa certa para falar sobre fé, mas um dia ouvi alguém dizer que: "Ter fé não é achar que Deus fará o que eu quero, mas ter a certeza de que Deus fará por mim tudo o que preciso" -- a médica sorriu -- Acho que devemos confiar. Ter fé é acreditar, e você acredita quando confia.
-- Eu sou ateia. Isso sim.
-- Você não é ateia. Ateia é aquela que não crê em Deus e, você crê sim num deus. Seja a "força máxima" que rege o universo, seja ele uma entidade inalcançável. Você apenas se decepcionou com as religiões, e no fundo é anti-religiões e não ateia.
-- Poxa! Estou surpresa com você doutora. Tem resposta para tudo. Até parece a Elisa.
As duas riram juntas.
-- E por falar em Elisa -- a médica voltou a pegar o celular do bolso -- Vou pedir para o comandante ir buscá-la.
-- A Pedrita também -- sussurrou ela para Talita, que assentiu e saiu do quarto, sabendo que quando a chefe pede, tem que ser tudo para ontem.
Bagé - RS
Sofia acendeu a luminária do quarto, pegou no colo o bebê que chorava e deu um beijo em sua cabeça carequinha.
-- Não chore gurizinho, a dinda Sofia está aqui -- murmurava, enquanto, carinhosamente, embalava o nenê enroladinho em uma manta. Olhou para Andreia que dormia profundamente e respirou aliviada. Tudo tinha terminado. A amiga e a criança agora passavam bem graças à eficiência do doutor Leandro. Quem sabe o que teria acontecido se ele não houvesse chegado a tempo. Sofia estremeceu só de pensar.
Ouviu o barulho de Leandro abrindo a porta e entrando no quarto.
-- Já vou indo. Andreia e o bebê estão bem e eu preciso pegar o ônibus para a cidade.
-- Mas, já? -- a decepção de Sofia era sincera.
Andreia se virou na cama, sentindo o corpo pesado de sono. Passando pela sensação momentânea de total desorientação, ela nervosamente levantou a cabeça e procurou pelo filho.
-- Ele está aqui, mãezinha -- Sofia riu do desespero de Andreia -- Estou me divertindo um pouco com a dinda -- disse, imitando a fala de uma criança.
-- Estava tão cansada que cai em um sono profundo.
-- É compreensível, Andreia. Foi uma madrugada e tanto -- Leandro se sentou na cama -- Você foi demais.
-- Você é que foi demais. Obrigada, fico te devendo essa pelo resto da minha vida.
-- O que é isso, boba. Não fiz mais que a minha obrigação -- o jovem médico se levantou. Parecia desanimado.
-- Está indo embora? -- perguntou Andreia, ajeitando-se melhor contra os travesseiros.
-- Estou. Esse lugar não tem futuro para um médico. Se eu fosse um veterinário, quem sabe, conseguisse mais trabalho. Esse povo daqui não ficam doentes nunca, parecem uns touros -- ele riu sem vontade -- Vou tentar a sorte na capital.
Andreia mordeu o lábio, pensativa. Queria muito ajudar o rapaz. Graças a ele, tanto ela quanto seu bebê estavam passando muito bem. Chegou mesmo a se perguntar se teria sobrevivido sem ele. Era uma dívida de gratidão que pagaria com todo prazer.
-- Sabe, Leandro. Talvez a minha esposa possa te indicar para algum hospital. Ou até mesmo para o posto de saúde da ilha.
Os olhos do médico se iluminaram.
-- Sério?
-- Sim. A Natasha é uma empresária de muito prestígio e gentil...
Sofia teve um ataque de tosse. Andreia revirou os olhos.
-- O que foi, Sofia?
-- Que ela é uma empresária de muito prestígio, até aí, tudo bem. Agora, ser gentil. Você está apelando né Andreia!
-- Natasha nunca deixou um amigo na mão. Esqueceu que ela não deixou você ir embora da ilha?
-- Esqueceu que a Marcela e a Sibele estão até hoje abandonadas na Ilha das Cobras a mando dela? -- retrucou.
-- Cruzes! -- Leandro ficou horrorizado -- Isso é verdade, Andreia?
-- Em partes sim. Você conhece a cobra Real? -- perguntou Andreia para Leandro.
O médico balançou a cabeça negativamente.
-- Cobra Real é aquela que além de ser a maior cobra venenosa que existe, ela ainda se alimenta de outras cobras, venenosas ou não. Pois é, essas são Marcela e Sibele -- afirmou ela, estendendo os braços para pegar o bebê -- Nós merecíamos um castigo bem pior que ir para uma ilha deserta. Natasha até que foi muito boa.
Sofia franziu a testa. Como que pressentindo o início de uma discussão, mudou de assunto.
-- Alguns dias antes de sairmos da ilha, ouvi a doutora Talita dizer que estavam comprando novos aparelhos para equipar o posto. Quem sabe ela não precise de mais médicos?
-- Trabalhar em uma ilha é algo que me deixa maravilhado só de pensar -- ele se flagrou curvando os lábios num sorriso -- Quando você vai falar com ela?
-- Assim que estiver forte o suficiente para poder viajar -- o bebê em seus braços começou a chorar e, como que por reflexo, Andreia ofereceu o seio para ele mamar -- Se puder esperar, prometo tentar convencer a Natasha a contratá-lo.
-- E olha que a minha amiga pode ser bem convincente quando quer.
-- Vou esperar. A ideia é muito tentadora -- Leandro abriu a porta do quarto e antes de sair avisou gentilmente -- Vou ficar na sala. Qualquer coisa é só me chamar.
Andreia sorriu para ele e acariciou o rosto da criança com a ponta do dedo.
-- Temos que ir para a cidade. Preciso ligar para a Talita, não suporto mais ficar sem saber notícias da Natasha.
-- Tá louca mulher? O doutor Leandro disse que mesmo de parto normal, a mulher tem que se cuidar.
Andreia ajeitou Marlon ao seu lado, deitou a cabeça no travesseiro e fechou os olhos.
Sofia pôde perceber o esgotamento no rosto pálido de Andreia e as profundas olheiras.
-- Você está cansada.
-- Estou -- concordou Andreia -- Acabei de acordar e já estou esgotada.
-- Eu vou pegar um cobertor para você -- disse Sofia, se levantando -- Está um friozinho chato hoje.
Andreia sorriu, agradecida.
-- Obrigada.
Natasha mexia no celular quando Elisa e Pedrita entraram no quarto. Ao vê-las, ela sentou, colocando um travesseiro nas costas e puxando os lençóis para baixo.
-- É impressão minha ou vocês vieram de fusca? -- indagou, por entre os dentes.
-- Eu não tenho asas! -- Elisa respondeu no mesmo tom.
-- Pensei em uma vassoura... Aiiiiii... -- Elisa acertou-lhe um tapa na orelha -- Grossa, mão de bigorna!
-- Não estou para desaforos -- resmungou -- O que você quer?
-- Bolinhos de banana!
Pedrita se aproximou da cama.
-- Então, o que você tem de tão importante para falar comigo e com a Elisa, que não podia esperar até amanhã?
Natasha remexeu-se na cama.
-- Contem-me sobre essa profecia sobre a qual você e Elisa vivem conversando. Mereço saber, não acha?
Elisa a olhou, a expressão incrédula.
-- Estou há anos querendo contá-la. Agora não quero mais! -- a senhora cruzou os braços e virou o rosto.
-- Certo -- Natasha suspirou e passou uma das mãos sobre o rosto -- Vou mudar a frase: -- Por favor, meninas. Contem-me sobre essa profecia sobre a qual vocês vivem conversando e eu nunca dei a mínima atenção.
-- Já que pediu com tanta educação. Agora sim, podemos conversar -- Elisa sentou-se em uma cadeira ao lado da cama. Pedrita puxando outra cadeira, também sentou-se -- É mais um sonho premonitório do que uma profecia.
Natasha assentiu, interessada, apesar de sua resolução em não ser convencida por explicações sobrenaturais.
-- Pois então me contem o sonho -- pediu Natasha.
Elisa olhou para Pedrita e começou a contar o sonho com certa hesitação, com um fundo de impaciência, como se achasse que no final, Natasha com toda a sua descrença, cairia na gargalhada.
Natasha, por sua vez, prestava atenção em cada palavra da senhora. Os olhos verdes estavam fixos nela.
-- O espírito que me conduzia disse baixinho: ele será o primeiro filho dessa mulher e virá ao mundo para trazer paz aos corações. Está na hora da gente voltar para o seu corpo. Sem que desse tempo de pensar, começamos a voar de volta para minha casa. O espírito que me acompanhava bateu levemente em minhas mãos e senti meu corpo espiritual adormecer -- Elisa suspirou fundo e olhou para a empresária. Não estava claro se o sonho a havia desagradado, se ela achou uma grande besteira. Ela não se manifestou a respeito. De qualquer forma, já havia contado.
Houve um longo período de silêncio. Elisa estudou detidamente seu rosto, e Natasha a fitou sem piscar.
-- Eu tive o mesmo sonho -- disse de repente -- Eu também fui levada a esse lugar e presenciei o nascimento do Marlon.
Elisa e Pedrita ficaram chocadas com a revelação.
-- Você teve uma experiência fora do corpo. Isso é maravilhoso! -- Pedrita, estava surpresa -- Você sempre foi tão cética.
-- Talvez fosse a vontade enorme que eu estava de estar presente ao parto que fez Deus ter pena de mim.
O tom de voz de Natasha era encabulado, e Elisa a olhou com carinho.
-- "Seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu". Esta é a terceira petição formulada por Jesus na oração que ele nos ensinou, o Pai Nosso. Que quer dizer: Seja feita a Vontade de Deus, não a nossa vontade.
-- Não entendo. Pensei que Deus enfim, havia atendido um pedido meu.
-- E atendeu -- afirmou Pedrita -- Se a nossa vontade for de acordo com as Leis de Deus trilharemos o caminho reto que leva a Deus e a nossa vontade será atendida.
-- Eu pensei que por ser uma transviada, ele não olhasse por mim.
-- A Lei de Deus é igual para todos: não poderia ser boa para o bom e má para o mau, porque tanto o bom quanto o que é mau estão sob as vistas do Criador, que faz o mau se tornar bom, e o bom se tornar melhor. Quando a criatura humana, num momento de irreflexão se afasta das Leis Divinas, e se entrega a toda sorte de dissoluções, a dor e a miséria, ferem a sua alma orgulhosa até que num momento supremo de angústia, ela possa elevar-se para Deus e decidir voltar ao caminho que leva à perfeição.
É então que, como o filho pródigo, o homem transviado, arrependido, volta-se para o Pai carinhoso e diz: "Pai, pequei contra Ti, já não sou digno de ser chamado seu filho..." E Deus, nosso amoroso Criador, abre àquele filho as portas da regeneração e lhe possibilita tudo o que for necessário para esse grandioso trabalho da perfeição espiritual.
Natasha ajeitou-se mais confortavelmente na cama macia.
-- Elisa... Você... Não pode falar com um dos seus amigos desencarnados e perguntar onde está a Andreia?
Elisa coçou a orelha.
-- Não! Eu não consigo -- Elisa desviou o olhar e fitou as próprias mãos -- Só conheço uma médium capaz disso.
Ao ouvir isso Natasha se inclinou para a frente, com um brilho estranho no olhar.
-- Quem?
-- A doutora Bruna Sontag.
Créditos:
https://www.dm.com.br/ciencia/2015/07/a-doenca-em-que-voce-sonha-acordado.html
https://www.espiritoimortal.com.br/seja-feita-a-tua-vontade-assim-na-terra-como-no-ceu-interpretacao-do-pai-nosso/
Significado de verossimilhança: Que tem aparência de verdade. Semelhante à verdade = plausível, provável.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Anny Grazielly
Em: 14/09/2020
Simplesmente perfeito
Mille
Em: 01/10/2018
Olá Vandinha
Ri aqui com a menção da Bruna.
Acho que a Nat irá sequestrar a Bruna cara até imagino a cena da operação sequestro da Loirinha a Bruna espeando falando que tem muitos filhos e uma mulher brava que iram se arrepender deste ato. Kkllk isso aqui é minha imaginação. Mais pode ser que depois desse tiro ela esteja mais educada e convide a Bruna e sua família para ir passar as férias em sua ilhas com todas as despesas pagas.
No momento Andreia terá que se recuperar para poder ir atrás de seu amor. Gostei do Leandro será que ele irá abalar o coração de Sidney ou Leozinho. E falando neles estou sentindo falta principalmente do Sidney pois ele é amizissimo da Andreia e não apareceu no momento do desperto e acusação da Carolina.
Bjus e até o próximo capítulo e uma ótima semana
Resposta do autor:
Olá Mille.
Vamos matar um pouco a saudade dessa personagem tão querida por nós. Tem outra figurinha que também vai aparecer no pedaço. Adivinha quem!
Beijos.
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NovaAqui
Em: 01/10/2018
Essa fui buscar no penúltimo capítulo kkkkkk só Bruna mesmo
rsrsrs
"O cara maduro, na faixa dos 60 anos de idade, sai com aquela gata escultural de 25 anos e a leva a um restaurante cinco estrelas, depois a uma danceteria, também de primeira, e acabam no melhor motel da cidade, um dúplex com piscina e hidro... Depois do bem-bom, para impressioná-la, dá um lindo anel de ouro a ela.
Após mais umazinha (graças a pílula azul), fumando um charuto e dando um tapa no uísque 12 anos, ela pergunta:
-- Meu amor, você me acha cara????
E ele responde na hora:
-- Querida, na minha idade não tem jeito: ou é cara ou é coroa!!!! ,"
Kkkkkk
Doutora Bruna junto com Natasha vai ser a cereja do bolo kkkkkk
Abraços fraternos procês aí!
Resposta do autor:
Kkkk... Boa.
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